sexta-feira, maio 27, 2005

Você tem que se aceitar... Aceitar que você não é linda como eu!

A apresentadora super-moderna estica-se lânguida sobre o divã estilizado e tenta uma careta bem sexy, bem no clima do programa. Ela mal consegue respirar com o espartilho que esmaga seus portentosos peitos recém-comprados. O diretor faz sinal que vai entrar uma ligação e ela se prepara sorridente para resolver a dúvida do adolescente afoito. Sexo na TV, um puta avanço!

- Ooooi? Qual seu nome? - Indaga a apresentadora criando um clima bem descontraído, bem “papo de amiga”, como frisou o diretor.
Carrrla - responde a voz do outro lado com sotaque bem paulistano.
-E aí Carlinha...Posso te chamar de Carlinha, né gata? O que que tá pegando?- Quer saber a apresentadora, fazendo uso de todo seu vocabulário técnico.
-Aiiii Pê (a menina também quer ser íntima da apresentadora), o “pobrema” é o meu namorado, o Jefferson.
- O pirú dele é pequeno? Interessa-se a apresentadora.
- Não é que...
- Então é muito grande? Noossa, pára tudo! É muito grande! O namorado dela tem um pirú gi-ga-nte! – Berra a agora animadíssima apresentadora, enquanto o gerador de caracteres exibe eletronicamente abaixo do divã a frase: “Eu não agüento a jeba do meu namorado”.
- Não é nada disso - diz a adolescente problemática cortando o clima da apresentadora. - Ele me acha... Ele diz que eu sou muito gorda...


“ Sou balofa e meu namorado me odeia!”, exibe o gerador de caracteres com um sintetismo invejável.
- Pô Carlinha, mas o importante é se aceitar como a gente é!
- Eu tenho um metro e sessenta e peso 93 quilos, Pê! - choraminga a menina
- Mas isso é lindo!- responde a dublê de VJ e sexóloga. - Todo mundo é lindo do jeito que é!
- Pê, mas se todo mundo é lindo do jeito que é, por que você fez lipoaspiração, colocou silicone e mudou seu nariz? - quer saber a (cada vez mais) confusa adolescente mal-amada.
- Eu fiz isso pra mostrar que ninguém é melhor porque emagrece e posa para a capa da Playboy - conta a apresentadora que escancarou sua ideologia num pôster duplo na Playboy do mês passado.
- Mas se todo mundo é bonito do jeito que é e você quis mostrar isso para a sociedade, não seria mais simples não ter colocado silicone, Pê?
- Eu quis mostrar que posso ser contra a padronização da estética e ter silicone! Acho importante ter alguém que defenda pessoas como você, amiga! Existe aí fora um monte de gente que é rolha-de-poço, caolha, puxa de uma perna... E essas pessoas são belas! Você é linda, Carlinha!!!
- Mas por que você precisou fazer todas essas plásticas, Pê?
- Olha, é que para nós que estamos na TV é muito complicado. Eu não queria ter que ficar assim, mas a pressão é enorme, você nem imagina! Você tem sorte porque pode se aceitar balofa como é, eu não! - responde lacrimosa a VJ, uma incompreendida.


Porque o que a pobre adolescente não conseguia enxergar era que que sua VJ preferida, na verdade, era vítima de um complô cruel que obrigava as mulheres a ficarem belas contra sua vontade. Uma verdadeira tortura onde todos eram culpados, principalmente o namorado dela.
- Mas você não tava lutando justamente contra isso, Pê? - Insiste Carlinha.
- Olha só queridinha, nosso tempo tá acabando... Você não quer pedir um clipe, não?
- Eu queria resolver meu problema, Pê... Me sinto tão mal...
- Vamos ver um clipe da Britney Spears?
- Mas eu nem gosto da Britney Spears!
...

- É isso aí, problema resolvido! No próximo bloco eu vou ensinar como uma virgem pode fazer sexo anal sem doer. Não sai daí, tá? - E despede-se com um beijinho sexy a apresentadora siliconada, uma verdadeira guerreira contra o falocêntrico mundo da padronização estética feminina.

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