segunda-feira, outubro 01, 2007

Headbanger Voice

Há uma certa época na vida do homem em que todo e qualquer tipo de socialização é apenas uma inegável tentativa de obter sexo. Os espécimes mais inteligentes e dotados de maior instinto de preservação buscam meios de socialização prenhes de presença feminina, o que obviamente facilita o contato, aumentando as possibilidades. Não era o caso de Leandrinho. Não obstante estudar em um colégio apenas para meninos, seus gostos e inclinações passavam longe dos esportes, da academia de musculação, da praia, das matinês em discoteca ou dos discos do Bob Marley e seus aditivos acessórios. Leandrinho era um headbanger botafoguense, o que afunilava bastante suas chances de aproximação do sexo oposto e do sexo como ato não solitário, por assim dizer. Há uma certa época na vida do homem que o cotidiano nada mais é que uma busca incessante que não mede esforços para sua realização. Não interessava quão negativos eram os prognósticos, Leandrinho era um homem com uma missão, um cruzado em busca de desvirginar seu Santo Graal.

Tendo suas opções reduzidas a arquibancadas de estádios suburbanos ou shows de speed metal em fétidos pardieiros da zona norte, locais sabidamente escassos de qualquer forma vagamente feminina, era preciso que Leandrinho apelasse para algum outro meio de travar contato. É necessário aqui abrir um parênteses para dizer que nosso odisseu sexual amargou a adolescência no início dos anos 90, isso é, antes da internet ser uma realidade e de cantoras teen executarem coreografias lúbricas bombardeando o subconsciente de meninas de 12 anos nos canais a cabo. Ok, havia a Xuxa e todas as outras apresentadoras infantis saídas do Concurso das Panteras, mas elas estavam arrependidas e deixavam isso bastante claro. Um desserviço à mentalidade do potenciais alvos de Leandrinho. Sem irmãos mais velhos ou mesada que lhe possibilitasse a extravagância de uma termas Solarium, a única saída viável era a seção de cartas de sua revista predileta, a Heavy Metal Maniacs.

Preocupado em agradar e ter imprescindíveis três minutos de conversa antes dos finalmentes, Leandrinho buscava sofregamente mês a mês uma parceira que tivesse os mesmos gostos que o seu. Nunca encontrou, o que o fez abrir concessões para qualquer mulher minimamente interessada e que vivesse em seu mesmo código postal. Arrá! não foi tão difícil, e a possibilidade mais tangível de uma relação sexual veio através do anúncio de uma menina moradora da Tijuca que ouvia Aerosmith, Metallica, Kreator, Ramones e DRI, era três anos mais velha (o que já era uma vantagem para suas intenções), gostava de jogar ovos nos passantes pela janela e se mostrava timidamente acessível ao dizer que buscava "contato com cabeludos da z/s e z/n afim de curtir muito". 'Contatos, cara!!!', 'Curtir muito!!!', Leandrinho se sentia o homem mais sortudo do planeta. Duas bandas carne de vaca, uma que ele sinceramente detestava, mas outras duas que eles poderiam realmente conversar sobre em intervalos espaçados entre suas muitas curtições. 'E além de tudo, é mais velha!', exultava. Sobre o hábito de atirar ovos da janela não formulou opinião, mas quem se importa? O universo sorria para nosso cruzado alvinegro fã de Sodom.

À troca de cartas e alguns rápidos telefonemas seguiu-se a combinação de um encontro em uma galeria na Tijuca no final de semana. Ao meio-dia de um sábado especialmente ensolarado, Leandrinho envergou uma nigérrima camisa do Exumer e, dotado de incomparável fé na foda vindoura, percorreu todas as estações da Linha 1 do metrô da cidade ao encontro de sua parceira. Ao subir as escadas rolantes da galeria, olhou diretamente para a porta da loja combinada como ponto de encontro e que já reunia uma meia dúzia de góticos, deathbangers e posers, todos sem mais o que fazer de suas vidas. No meio de um mar de cabelos ensebados e rostos oleosamente púberes não foi difícil avistar um grupo de três meninas: Uma gordinha de chinelo, calça de moletom, camisa do Guns N' Roses e boné; uma magra e bizarramente alta garota vestida com camisa do Ramones, botinas e uma camisa de flanela amarrada pouco acima da cintura; e uma morena de camisa branca, tamancos e short de lycra preto que Leandrinho, numa esperança vã, se esforçou para acreditar que era sua correspondente. Obviamente não era e, apresentações feitas, ela e sua irmã mais nova (a gordinha de moletom e chinelo) deixaram o casal a sós.

Poucas situações se comparam ao constrangimento de encontrar pela primeira vez alguém com quem você se comunicou por carta ou telefone. A falsa intimidade e o exagerado carinho que comandavam esses contatos posteriores somem no exato momento que você se depara com a pessoa e ela não corresponde nem às suas menos exigentes expectativas. Não que isso se constituísse num problema real para Leandrinho. O homem estava em busca do bem maior, não se permitiria refugar ou preocupar-se diante de miudezas. "Quer ir lá em casa?", ela perguntou com sua monocórdica voz agudo-metálica que também não era um atrativo. "Claro, vambora!", respondeu Leandrinho em nome de sua irrefreável busca.

Portaria, elevador, porta, sala, apresentar-se e fingir cordialidade com os pais, quarto. Em cinco velozes etapas lá estava ele no berço de sua presa. Nunca fora tão fácil, pois afinal, nunca havida sido. Leandrinho se pôs então a guiar a conversa meticulosamente de maneira que eles subitamente estivessem falando de sexo para que, então, ele fizesse os movimentos que o levaria para baixo daqueles lençóis de motivos florais:
- Como assim você não gosta de Aerosmith, menino? Você só pode ter um problema... - brincou a garota bizarramente alta que com seu timbre e empostação se assemelhava a uma Olívia Palito ciborgue.
- Ah é, sei lá...
- Eu adoro Metallica e Kreator.
- E de sexo você gosta? - intimou Leandrinho da forma mais meticulosa que conseguira, aproximando-se da garota sentada na cama.
- Não sei - respondeu a menina sem demonstrar alguma surpresa com a pergunta, muito porque não demonstrara reação nenhuma.
- Não sabe? Pô, que isso... - Leandrinho aninhou suas mãos entre as coxas da menina que, para sua alegria, novamente não demonstrou reação.
- Você quer ver uma fita de clipes que eu gravei? - indagou a menina com seu timbre robótico.
Dando-se conta de que aquela era a tal hora em que se dividem os homens dos garotos e, sem saber em que lado da divisão ficaria, Leandrinho tratou logo de agarrar os peitos da garota sob a camisa dos Ramones: Quero ver isso aqui, oh! - afirmou em toda sua fúria de macho desesperado.
E a menina bizarramente alta que falava como um andróide e lembrava uma versão roqueira da Olívia Palito deixou. "Ela deixou!!!", mal podia crer Leandrinho em agradecido extâse.

Sabendo que timing nessa vida é tudo, Leandrinho decidiu dar curso a sua virilidade da foma mais rápida que conseguisse. Como não encontrava resistência alguma da menina e não estava muito preocupado em analisar o quão consentido aquilo estava realmente sendo, levantou-se, abaixou-se as calças na frente da Olívia Palito do rock e mostrou todo o esplendor de sua erupção hormonal adolescente na forma de pau. Duríssimo pau. Nunca mais o desespero do descontrole de testosterona se esvaindo como constrangedoras manchas no lençol. Uma nova era se iniciava ali naquele quarto tijucano decorado por páginas de revistas de rock coladas nas paredes.

Dez centímetros separavam seu pau da boca e olhos desentusiasmados da garota. Cinco segundos separavam sua vida até ali da sua nova e promissora fase como reprodutor. Dois passos e meio e uma bandeja de sanduichinhos de mortadela no chão separavam o sonho de consumar o ato de uma mãe atônita. De uma mãe revoltada. De uma mãe histérica que partiu violentamente contra Leandrinho e seu pau que nessa altura do campeonato já não apresentava a mesma certeza, desinibição e rigidez de cinco minutos atrás. Um casal de pais super-protetores e a ameaça de chamarem a polícia separavam nosso obstinado headbanger de dar fim a um sem número de dias em ansiosa espera de uma vez por todas. Só restava bater em vergonhosa retirada e, sem dinheiro para a volta de metrô, esperar o ônibus em frente a portaria. Dois minutos, não mais que dois minutos e, após o estalo característico e uma pontada no ombro, Leandrinho percebe a baba amarela escorrendo pelo braço, manchando a nigérrima camisa do Exumer. Lá de cima, a garota magra e bizarramente alta ri com seu timbre agudo-metálico como um robô maligno a segurar uma caixa de ovos. "Disso você gosta né, sua filha da puta?". A vida pode ser muito triste quando se é um headbanger botafoguense e virgem.

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