sábado, setembro 29, 2007

Um mundo melhor que não foi feito para você

Existe um mundo paralelo vivendo e respirando pelas ruas do Leblon e Ipanema. É um mundo de gente não necessariamente bela, mas que é apontada como "gente bonita" nos editoriais das revistas de moda. Um mundo paralelo convivendo mais feliz que a maioria e sob nossos olhos, sem que possamos, contudo, identificar seus habitantes, apesar de os vermos constantemente. São as pessoas contentes que caminham com sacolas de griffe saindo do shopping Leblon para comer uma saladinha e dar uma esticada num cinema do Estação para ver um "coreano novo que todo mundo diz que é bárbaro!". São as personagens constantes das colunas sociais sendo alvo de matérias comportamentais da revista de domingo d' O Globo. Os habitantes desse mundo paralelo são medianamente inteligentes, são intelectuais mais sem aquele ranço chato e apalermado. Eles são cool, usam óculos coloridos e sem eles o que seria da lista dos mais lidos na Veja? Eles gostam de frequentar a Livraria da Travessa, gostam do conforto de poder sentar numa poltrona dentro da loja e folhear livros que eles vão comprar, mas não vão ler porque não terão tempo. É preciso buscar os filhos no curso de grafitti dado por uma meninada super-legal que abriu uma lojinha ali perto da Pizzaria Guanabara. Um dos meninos é filho daquele cara, lembra? E há tantas vitrines novas para se ver, tanto para comprar. No fim do mês o Tim Festival, preços extorsivos não são um incômodo pois "a cultura não tem preço!". Oh meu deus, se eles não fossem eles, pode estar certo de que não aguentariam isso muito tempo. Três vivas por sermos quem somos, narciso!

Mas o povo do mundo paralelo está preocupado. A violência nessa cidade não dá trégua nem para aqueles que vivem uma vida à parte. O povo do mundo paralelo protesta a sua maneira, na saída das escolas e com camisetas assinadas por artistas plásticos. A arte é necessária, a pós-modernidade é um fardo que o povo do mundo paralelo carrega como destino-manifesto. Depende de nós, eles dizem. O que seria do toy art e das revistas de design se não fossem eles a compreendê-las? O que seria do cinema da PUC a produzir novas e geniais meninas que ocuparão um cargo de importância sumária em alguma produtora localizada numa casa de Botafogo? O que seria das artes visuais sem os brilhantes magos d' OEstúdio a darem uma dimensão filosófica ao consumo de supérfulos? Qual seria o destino dos cursos no exterior e de tudo o mais que só pode ser consumido e entendido plenamente por eles? "Nos deixem aqui cuidando do que fazemos melhor, vocês não gostariam de se preocupar com isso".

Existe um mundo paralelo e ele não é o seu, ele não foi feito para você. Mas não confunda as coisas. Esse mundo paralelo pouco tem a ver com as torres de marfim e os pitbulls criados como filhos pelas elites. Nenhuma semelhança com a ostentação vulgar dos ricos demais, com os acidentes e incidentes que pululam no jornal incentivando sua raiva branca e inofensiva. Não! Esse tipinho serve apenas como matéria-prima para as colunas no final do Segundo Caderno. E o povo do mundo paralelo está assinando essas colunas, está repudiando o outro e cuspindo no espelho. Está dançando ao som de minimal e neo-funk nas festas da Lapa revisitada que eles tanto amam, mas de onde preferem manter distância geográfica. Eles estão desfilando pelo blocos de carnaval do Jardim Botânico, aplaudindo um espetáculo com concepção gráfica de Gringo Cardia e Mutti Randolph, apresentando projetos na produtora de Regina Casé para serem executados por Guel Arraes, fazendo parcerias musicais com o Kassin ou Amarante, tendo o novo disco do Caetano como a trilha-sonora de uma valsa doce que os conduz diretamente para eventos no MAM ou na Marina da Glória e novamente de volta para o conforto de uma sala bem decorada. Existe um mundo paralelo vivendo e respirando e sendo mais feliz do que eu e você.

4 comentários:

Unknown disse...

caraca. sensacional !!

Sofia Florence disse...

Bela descrição da Zona Sul Menezes. Quando eu vou para o RJ e fico na casa da minha avó ou tio (que são da Z/S) eu sinto a mesma coisa descrita nos primeiros paragrafos.
E ah! eu adoro a Livraria da Travessa.

Menezes, o cretino disse...

Você adora sentar numa poltrona e folhear livros de arte da Taschen, Sofia? hehehehe!

Pô, quando vier pra cá, dê um toque via blog que eu te levo pruns programas mais bacanas que esse!

Sofia Florence disse...

Eu devo ir em algum feriado pro RJ, nada certo.
É mais facil eu te achar em Buenos Aires no final do ano do que no RJ.
Mas eu dou um toque.
Alias, eu queria falar com voce sobre o apto. que voce e sua namorada alugaram em Buenos Aires, eu tô indo no final do ano e acho que vale mais a pena alugar um apto do que ficar em albergue.
Me adiciona no msn
sofia.reis89@hotmail.com

E sim, adoro os livros de arte da Taschen. hahahaha